Máfia de seguro surrupiou corpo do IML e fez enterro
Polícia investiga bando que se passou por parente de morto por atropelamento para tentar sacar R$ 13.500 do DPVAT
Rio - Um morto por atropelamento, com problemas mentais e sem relacionamento familiar. É o ponto de partida do golpe quase perfeito que bando especializado em fraudar seguros de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Via Terrestre (DPVAT) precisava. A quadrilha fraudou documentos, liberou o corpo de Mário Thomaz de Aquino, 54 anos, no IML e enterrou-o. Tudo para abocanhar os R$ 13.500 do seguro, que só não foi pago porque o acaso fez com que parentes soubessem da fraude. Quinta-feira, dois golpistas foram presos.
Aí começa a trama que a 18ª DP (Praça da Bandeira) tenta desvendar. Um suposto funcionário do IML chamado Sandro procurou a família de Mário no endereço dele, em Manguinhos. Lá, descobriu que ele tomava remédios para distúrbios psiquiátricos e que quase não via a família. Quem cuidava dele era uma vizinha que tentou liberar o corpo, em vão.
Ela voltou depois ao IML e se surpreendeu ao saber que uma das filhas já o enterrara. Era, na verdade, um membro da quadrilha que, com os dados reais da filha, falsificou carteira de identidade, retirou o corpo, enterrou Mário e deu entrada na indenização. “Me assustei pois cuidava dele há 5 anos. Como as filhas, que o viam pouco, souberam da morte e organizaram tudo?, pergunta-se a vizinha.
Dupla foi presa após enganar advogado
O acaso jogou por terra os planos da quadrilha que já começou a ser desmontada. Quinta-feira um casal foi preso por participação no esquema e um outro está foragido. O erro fatal foi tentar atrair e enganar um advogado. Um parente esbarrou com a vizinha que cuidava de Mário e soube da morte dele. Uma filha foi ao IML e soube que alguém se passara por ela usando seus dados para liberar e enterrar seu pai. No Cemitério do Murundu, Realengo, há registro de que na cova rasa 7646-A Mário foi sepultado sem familiares. Orlando Zacone, delegado da 18ª DP (Pça da Bandeira), não descarta exumar o corpo.
Com atestado de óbito, registro de ocorrência do atropelamento e documentos falsos da filha e do morto, o bando requisitou a indenização do DPVAT. Tem direito a R$ 13.500 parentes de mortos ou pessoas que ficam inválidas em acidentes de trânsito. Acidentados têm direito a reembolso de despesas médicas.
Os bandidos alegaram não ter R$ 4 mil para o sepultamento e convenceram um advogado a pagá-lo, prometendo ressarci-lo após receberem a indenização. Ele abriu a conta bancária em nome da filha — com dados verdadeiros dela, inclusive telefone — para o depósito do DPVAT.
Só que, já sabendo do golpe, a filha verdadeira tentou bloquear o pagamento na seguradora, que avisou ao banco. O advogado foi contatado e, ao perceber que era vítima da fraude, atraiu a dupla para que equipe da 1ª DP (Praça Mauá) prendesse o casal. O IML e a Polícia Civil não comentaram o caso.
Quadrilha denunciada em 2006
Em maio de 2006, O DIA denunciou uma quadrilha que agia no IML especializada em vender corpos com atestado de óbito, certidão em cartório e enterro em um dos 13 cemitérios do Rio. O preço do serviço da Máfia dos Corpos variava de R$ 1,8 mil a R$ 3 mil e os cadáveres eram destinados a golpes de seguros ou a famílias interessadas em acelerar heranças ou pensões do INSS em casos de desaparecidos. Dois agentes funerários foram presos.
Na época, dois integrantes da quadrilha foram identificados e presos. Além disso, a participação de médicos legistas do IML também foi comprovada. A fraude só foi descoberta quando uma das vítimas da quadrilha, M., 27 anos, que procurava o corpo do irmão G. O médico que assinou o atestado de óbito falso em nome de G. foi suspenso pelo Conselho Regional de Medicina. O DIA revelou também o caso de um cabo da Aeronáutica que comprou o kit para forjar sua morte e fazer com que a família embolsasse R$ 477 mil de seguro mais pensão militar. Ele foi preso.
Por Felipe Freire
Fonte: O Dia (http://www.odia.com.br) – 13/08/2011.
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